O grande pensador e sociólogo Jessé Souza, em “A Elite do Atraso” (Leya, SP, 2017), antecipa estudo, que está em curso, e nos apresenta, ao lado da descrição da classe média, as suas frações. Transcrevo:
“Classe média é uma classe intermediária entre a elite do dinheiro, de quem é uma espécie de capataz moderno, e as classes populares a quem explora, ela tem que se autolegitimar tanto para cima quanto para baixo”. “Os quatro nichos ou frações de classe ....... denominamos fração protofascista, fração liberal, fração expressivista, que costumo apelidar de “classe média de Oslo”, e a menor fração de todas, a fração crítica”.
Como é óbvio, se há uma classe média, supõe-se uma classe alta e outra baixa. Se isto ocorreu, com razoável clareza na evolução da sociedade capitalista, o estágio atual do capitalismo – o financismo – provoca algumas novas considerações.
No capitalismo mercantil e no industrial, que conhecemos do século XVII a meados do XX, era fácil perceber o interesse da classe alta, a posição de capatazia, benevolentemente denomino gerenciamento, da classe média e da trabalhadora classe baixa. Cada uma com seus desejos, recursos e interesse em progredir.
Creio que em Norbert Elias li ser a moralidade o que distinguia a burguesia da aristocracia francesa, esta dominada pela devassidão, mas com intelectuais ainda hoje celebrados. Ali se fazia uma questão de definir modos e estilos de vida. Também em Elias se apresenta o confronto da classe média com a aristocracia prussiana, mas lá pelo conhecimento. Daí não haver um Saint-Simon ou um Chateaubriand naquela aristocracia germânica.
Mas neste colonizado Brasil, a classe média se forma sob a proteção do Estado, ou com o Estado, que é, no geral e com poucas exceções, o grande gerenciador dos interesses do estrangeiro e seus representantes nativos.
É preciso ter claro que, aqui e em muitos outros países, o Estado é o protetor e fornecedor de recursos para a classe alta, para os verdadeiros ricos e não para os assalariados.
Em artigos anteriores, procurei demonstrar que os golpes tinham, entre seus diversos interesses, o de evitar a industrialização brasileira. Recorde o de 1945, de 1954, de 1964 e, agora, da Lava Jato. O próprio golpe dentro do golpe, que sofreu Ernesto Geisel, levou o “neoliberal”” Figueiredo ao poder.
Mas a situação mudou. Leiamos a reflexão de Ruben Naveira:
“Ocorre que a classe média não se vê como classe dominada. Primeiro, porque ela almeja ascender à classe dominante (como se o poder no Brasil não fosse regido pela lei maior da concentração), e ademais porque ela sempre se prestou a instrumento da classe dominante para a dominação mais ostensiva das classes desfavorecidas. Ela, dominadora dos que lhe estão abaixo, pode não se ver como dominada pelos que lhe estão acima, mas é”. (Ruben Bauer Naveira, A Elite Brasileira Suicida-se, em GGN Jornal de todos os jornais, 07/02/2017).
Desde 1990, o capitalismo financeiro, que abrevio “banca”, domina o capitalismo.
Adrian Salbuchi, escritor argentino, no notável “El Cerebro del Mundo” (Editorial Solar, Bogotá, 2004), afirma que a banca é o Poder, e para exercê-lo e manter-se construiu uma “tecnoestrutura supranacional”.
Esta tecnoestrutura é composta de unidades financeiras, educacionais, de comunicação, de associações de classe (civis e militares) e de pesquisa, que permitem à banca agir, sempre, com precisão e oportunidade, em qualquer parte do mundo. Como se infere sem dificuldade, estas unidades são a nova capatazia. Agora globalizada.
Os exemplos são numerosos: a crise grega, as demandas financeiras de bancos alemães, a guerra na Síria, a guerra civil na Ucrânia, os golpes pró e contra muçulmanos no Egito e, também, algumas derrotas como a eleição de Trump e o Brexit.
Agora, caro leitor, o que teria a classe média, fora da produção de petróleo a grandes profundidades, tecnologia própria da Petrobrás, a oferecer à banca. Pois os controles e aproveitamento dos recursos naturais, biológicos, minerais já são realizados por empresas estrangeiras, e há muito tempo. A classe média só tem a oferecer a repressão policial. E esta não é cara; qualquer grupo mercenário pode ser usado.
Portanto, a classe média brasileira tornou-se descartável. Principalmente nas frações menos agressivas. E a invasão/provocação, sem qualquer receio ou pudor, com que os Temer, de todos os poderes (sic) da República, diariamente agridem a classe média, que os colocou lá, é resultado da inexpressividade de quem se posicionou do lado contrário a seus próprios interesses.
Veja, portanto, que a situação mudou, e a classe média, escravagista e obtusa, não percebeu.
Há duas ações que caracterizam a banca; uma delas é a permanente concentração de renda. Como alertou Ruben Naveira, como passar para outra classe se as “vagas” de lá decrescem.
Venho, desde os anos 1970, acompanhando empresas internacionais, parte pela necessidade profissional e parte pela curiosidade em conferir fatos com ideias. Quando do empoderamento da banca, pelas medidas adotadas por Margaret Thatcher/Ronald Reagan, cerca de 90 famílias controlavam perto de um terço dos fluxos monetários internacionais. Hoje menos de 50 respondem por quase a metade destes fluxos.
Não se trata de saber quem é rico ou muito rico. Mas, aos poucos, estes trilionários serão tão poucos que tornam inevitável uma catástrofe universal. Caso contrário eles serão derrotados pela pressão demográfica. E haveria então espaço para esta estulta classe média brasileira?
Convivo com esta classe. Assombra-me a ignorância de fatos e compreensão dos eventos mais evidentes. Os pobres, com quem também convivo, tem mais discernimento, ou sabem melhor o que lhes convém.
Também a classe média empresária parece não entender que o outro objetivo da banca é se apossar de todos os ganhos, de todos os setores econômicos, de todas as áreas de negócio. E isto, de início, significa mais trabalho e menos ganho, até só trabalho e o ganho de assalariado.
Fico portanto um tanto perplexo e um tanto no desalento de quem não vê uma saída capaz de articular o interesse nacional com a enorme maioria da classe média. E sem ela, os pobres também, pelos séculos de escravidão, quer pela etnia quer pela remuneração, ficam desnorteados, sem lideranças.
A preocupação do ensino no Brasil foi, quase unicamente, adestradora.
Formar braços mais capacitados para o trabalho, nunca mentes mais capazes de pensar.
E surge, como um bônus golpista, a escola sem partidos, ou seja, a escola do partido único, da doutrinação colonial, da ausência de crítica.
Se temos três classes, vamos reduzindo a uma, a mais pobre.
A rica que não passar a superrica será engolida na concentração, a média, desnecessária, terá a remuneração da pobre. E está será reduzida pela contingência demográfica.
Para que Brasil?
Países que chamávamos Líbia, Iraque, Ucrânia, Afeganistão já são colônias de empresas estrangeiras, cada uma com seu território, explorando um recurso finito, e com suas milícias para defendê-la.
Aos poucos, insuflados pela banca, podem surgir movimentos independentistas, regionalistas e começarão a estilhaçar o Brasil.
E as Forças Armadas, majoritariamente, poderia dizer integralmente, formadas pela classe média estarão discutindo corrupção, esquerdismos, comunismos e outras ideias divulgadas pela mídia da banca, sempre onipresente.
Será mais do que o suicídio de uma classe, será o suicídio de uma nação.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador pedroapinho652@gmail.com